A montagem, que tem trilha original Carlinhos Brown , será exibida neste sábado (25), às 20h, com acesso gratuito
A Cia. Deborah Colker (RJ), de dança contemporânea, estreia seu novo espetáculo, “Cura”, de maneira virtual, através de exibição pela Globo Play, neste sábado (25), às 20h. A obra nasceu a partir da experiência pessoal da coreógrafa Deborah Colker, que passou os últimos anos na busca por uma cura para uma doença genética que seu neto tem, a epidermólise bolhosa.
Segundo a produção do espetáculo, a obra vai muito além do aspecto autobiográfico, trata-se de ciência, fé, da luta para superar e aceitar nossos limites, do enfrentamento da discriminação e do preconceito. A coreógrafa concebeu o projeto em 2017, mas foi no ano seguinte, com a morte de Stephen Hawking, que encontrou o conceito.
Embora acometido por uma doença degenerativa, a ELA (Esclerose lateral amiotrófica), o cientista britânico viveu até os 76 anos e se tornou um dos nomes mais importantes da história da física. Assim, Deborah percebeu que há outras formas de cura além das que a medicina possibilita.
“Quando foi diagnosticado, os médicos deram a Hawking três anos de vida. Ele viveu mais 50, criativos e iluminados. Entendi o que é a cura do que não tem cura”, conta Deborah. A estreia aconteceria em Londres em 2020, mas a pandemia não permitiu. Então, o adiamento deu ao espetáculo mais um ano de pesquisas, transformações e reflexões.
A pandemia me fez ter certeza de que não era apenas da doença física que eu queria falar. A cura que eu quero não se dá com vacina.
Deborah Colker
Há dores mostradas no palco, mas há esperança no final. Ela diz que procurou preservar a alegria necessária à vida. Um ingrediente para isso foi a semana que passou em Moçambique durante a preparação, quando conheceu pessoas que não perdiam a vontade de viver, apesar das muitas dificuldades. “Fui procurar a cura e encontrei a alegria”.
Deborah incorporou ao espetáculo referências das três religiões monoteístas e elementos de culturas africanas, indígenas e orientais. Logo no início, conta-se a história de Obaluaê, orixá das doenças e das curas. “A ponte entre fé e ciência me ajudou muito. Fui experimentar o invisível, a sabedoria do invisível”, explica a coreógrafa.
Numa cerimônia realizada quando da morte do seu pai, Deborah conheceu o rabino Nilton Bonder, autor de “A alma imoral” e muitos outros livros. Ao planejar “Cura”, decidiu convidá-lo para desenvolver a dramaturgia. Dentre tantas contribuições, ele ressaltou que “pedir é curar”, ideia que gerou uma cena. Também apontou que “a grande cura é a morte”, o que motivou uma coreografia com dois bailarinos dançando ao som de “You want it darker”, de Leonard Cohen.
Bonder diz que o espetáculo apresenta todos os recursos imunitários e humanitários em aliança pela cura. A ciência, a fé, a solidariedade e a ancestralidade são o coquetel de cura do que não tem cura. “Concebido antes desta pandemia, o título não é um ‘conceito’, mas um grito!”, afirma Bonder.
Carlinhos Brown foi convidado, inicialmente, para compor apenas o tema de Obaluê. Acabou criando praticamente toda a trilha, inclusive a canção inicial, dos versos “Traga meu sorriso para dentro” e “Sou mais forte do que a minha dor”. “A música veio na minha cabeça logo depois da primeira conversa com Deborah”, lembra o músico.
Eu pensei: ‘Isso é um chamado, não é uma trilha normal’. É um trabalho muito mais profundo do que ‘Carlinhos está fazendo uma trilha’.
Carlinhos Brown
Ele canta em português, ioruba e até em aramaico. Os 13 bailarinos também cantam, em hebraico e em línguas africanas. É algo que acontece pela primeira vez nos 27 anos de história da companhia.
Fundador da companhia ao lado de Deborah, o diretor executivo João Elias vê em “Cura” um passo ainda maior que o dado pela coreógrafa no trabalho anterior, “Cão sem plumas” (2017), baseado no poema de João Cabral de Melo Neto. “Quando começou a coreografar, Deborah era mais abstrata, formal. Depois, passou a contar histórias, aprimorar dramaturgias. ‘Cão sem plumas’ já era um espetáculo visceral, emocionante. ‘Cura’ é ainda
mais, mostra um grande amadurecimento”, analisa ele.
Companheiro de Deborah em toda a trajetória, o cenógrafo e diretor de arte Gringo Cardia é outro que destaca a importância de “Cura” para a artista. “Ela era toda ciência. Passou por um crescimento espiritual. Foi conversar com Deus neste espetáculo”, afirma. Sua assinatura está nas duas rampas que dão aos movimentos dos bailarinos a sensação de desequilíbrio.
E também está nas caixas que, entre várias funções, formam um muro. “O muro passa a imagem de um grande obstáculo, mas ele se divide em vários pedaços. Então, é possível atravessá-lo. É como a gente faz nas nossas vidas”, diz Gringo.
Nos figurinos de Claudia Kopke – que esteve em “Cão sem plumas” – as pernas podem ter estilos bem diferentes, traduzindo o desequilíbrio que é um dos nortes do espetáculo. ” Os bailarinos têm as cabeças cobertas, usam balaclavas, mas o final é dourado, de alegria”, explica.
O iluminador Maneco Quinderé, que só havia trabalhado com a companhia em “Vulcão” (1994), também criou uma luz fragmentada, como sugerem as ideias de “Cura”. O final tem brilho, indicando renascimento. “Cada segmento tem suas características, e eles formam um caleidoscópio”, pontua.
Criação, coreografia e direção: DEBORAH COLKER
Direção executiva: JOÃO ELIAS
Música: CARLINHOS BROWN
Direção de arte e cenografia: GRINGO CARDIA
Dramaturgia: NILTON BONDER
Figurino: CLAUDIA KOPKE
Desenho de luz: MANECO QUINDERÉ
Realização: JE PRODUÇÕES LTDA.
Duração: 1h15 MINUTOS (sem intervalo)
Classificação: LIVRE
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